domingo, 7 de dezembro de 2008

AS LETRAS

ENCONTRO DAS ÁGUAS
Jota Maranhão / Jorge Vercillo 

Sem querer
Te perdi tentando te encontrar
Por te amar demais sofri, amor
Me senti traído e traidor

Fui cruel
Sem saber que entre o bem e o mal
Deus criou um laço forte, um nó
E quem viverá um lado só ?

A paixão veio assim
Afluente sem fim
Rio que não deságua

Aprendi com a dor
Nada mais é o amor
Que o encontro das águas

Esse amor
Hoje vai pra nunca mais voltar
Como faz o velho pescador
Quando sabe que é a vez do mar

Qual de nós
Foi buscar o que já viu partir
Quis gritar mas segurou a voz
quis chorar mas conseguiu sorrir ?

Quem eu sou
Pra querer
Entender
O amor ?



FILOSOFIA DE AMOR 
Jota Maranhão / Deusdedith Maranhão / Paulo Cesar Pinheiro
Participação Especial de Jorge Vercillo

Quem por mêdo do amor que morre
Na hora que o amor percorre
Recua, se afasta e corre
Ouça o conselho que eu lhe dou
É só você morrer de amor
Que a chama do amor não morre

Quem por mágoa de amor se abate
Por mêdo que o amor maltrate
Ao invés de se dar combate
Ouça o conselho que eu lhe dou
É muito mais cruel a dor
Na casa que o amor não bate

Filosofia de amor não é rei nem doutor
Quem aprende
Só vai sair vencedor de um combate de amor
Quem se rende

Filosofia de amor só não é sabedor
Quem renega
Só vai prender seu amor e virar seu senhor
Aquele que se entrega
E o poeta é o professor que ensina todo dia
Filosofia de amor !...



DAS DORES 
Jota Maranhão / Paulo Cesar Feital

Nossa Senhora das Dores do Amor
Faço qualquer penitência
Promessa ou novena
Mas tira essa dor do meu peito
Arranca essa flecha do meu coração
Do meu coração
Que a saudade de um amor que se vai
É castigo demais sem perdão

Nossa Senhora das Dores do Amor
Seca de vez meu olhar
Enxuga meu pranto cansado de dor

Mãe da paixão do senhor
Ah!... Será que teu filho não se apaixonou
Por outra maria que a bíblia negou
E de saudade chorou

Tira, madrinha, essa flecha
Que a ponta envenena meu sangue de amor
Ou me devolva, serena
Essa pele morena que me enfeitiçou !...



CICATRIZ
 
Jota Maranhão

Eu sei que o teu olhar não fala mais
As coisas que meus olhos querem ouvir
Sei que teu coração já não tem paz
E quer fugir
Voltar... Jamais !...

Eu vejo a noite negra em teu olhar
E as gotas de orvalho no lençol
Mas quem sou eu pra te dizer que amar
É se entregar até o fim !

Sim, eu tinha sede de te vêr feliz
Eu tinha fome era de vêr teu nome
Brilhando nos letreiros de neon

Não, mas das palavras não escuto o som
Da tua boca só mesmo o baton
Que deixa marca como cicatriz

Pra onde foi o nosso amor gentil
Que só deixou em nós a compaixão
Será que um dia vai voltar febril
E conceder o seu perdão ?

Se o meu êrro foi te amar demais
Paguei meu preço e não mereço mais
Viver fingindo, amor, que tanto faz
E ser assim tão infeliz !...



RETRÓS

Jota Maranhão / Moacyr Luz

A eternidade desse amor foi me revelando
Quando a saudade e o rancor são do mesmo pano
Mas eu manchado de licor vivo costurando
Uma presilha que remende esse engano
Um meridiano amor

Até tentei trocar o cós de arrependimento
Outro novelo ao invés de um nó nesse sofrimento
Atarantado no retrós do meu juramento
A gargantilha, tua voz, desalento
Invento um modelo, amor...

Naturalmente revistei o meu coração
Aquela nêsga que alinhei deve estar no chão
É evidente que evitei desfiar a nossa condenação

Tecer o avêsso é tão comum quando em desalinho
A gente esbarra no debrum e arrebenta o linho
O nosso muito é nenhum quando advinho
E a redondilha acaba num colarinho
Na mancha de vinho, amor...



NOVOS RUMOS 
Jota Maranhão

Quero novos rumos
Derrubar os muros
Quero ver frutos do novo estatuto
Com salvo conduto

Quero o recomeço
Pela a igualdade
Sem pagar o preço de mais um tropeço
Com a liberdade

Quero a ousadia da democracia
Sobre a burguesia
Sem a fantasia dessa tirania

Ah!... Como quero vêr esse mundo assim
Ah!... Não posso ficar mudo esperando seu fim

Minha teimosia na filosofia
Não me valeria
Se a maioria fosse minoria

Sonho pelos homens
Pela vida sã
Pois não somos reféns
Nem tampouco apaches
Como foi de praxe

Quero meu destino traçado por mim
Sem cantar o hino
Como fosse bandido chegando seu fim


Ah!... Como quero ver esse mundo assim
Ah!... Não posso ficar mudo esperando seu fim

Quero o trem nos trilhos
Criar nossos filhos
Semear o milho
Nos olhos o brilho de um vencedor

Quero o bem supremo
Ter nas mãos o remo
Invadir fronteiras
Minando as trincheiras
Entre você e eu

Quero na lembrança
Deixar de herança
O amor delirante
E seja doravante
Nosso governante



DELICADEZA 
Jota Maranhão / Jorge Vercillo

As coisas tôlas que o amor parece me dizer
Falam na delicadeza, o elixir do prazer,
Na paixão

São os seus olhos olhando nos meus
As suas mãos envolvendo minhas mãos
Esse é o jogo do amor e da sedução

Que deixa na boca o sabor
Que o beijo não provou
Brilha na pele o suor
Que o corpo não tocou, por saber

Que essa vontade contida no ar
Faz aumentar a ilusão do querer
É o faz de conta do amor rondando você

Te quero assim ... Como a luz da manhã
Chegando mansinha pra não te assustar
E quando se vê
É um sol que não se apagará

Se o jogo do amor é estar por um triz
Você me deixou envolvido demais
Se a dor levou, o amor me traz
E eu tô feliz !...

Cercados por essa magia que se chama desejo
Nossa própria armadilha
Teu cheiro no ar, incenso de amor
Perfume da mais rara flor
Que enfeitiça o lugar !



BOTEQUIM DA VIDA 
Jota Maranhão

Quero pro meu corpo
A escuridão de um calabouço
Quero que o amor prometa
E jamais se cumpra

Quero que me sejas fiel
Sendo cão e gato de um mesmo bordel
Quero ser teu réu
Inferno e céu

Quero que me pagues o amor com fel
Que vistas teu véu
E me faças lembrar como aconteceu
E sejas cruel... Mereço !

Porém me deixe ter um fim de artista
Na mesa de um botequim da vida!...



VIRTUDE 
Jota Maranhão / Jorge Vercillo

Entrei em transe, perguntei pra Buddha:
_ Se o amor é uma virtude,
porque o mundo não muda?

Telepáticamente êle sorriu
como um pai sorri pro filho
êle me disse tudo:
_ O coração tem forças ocultas,
pode ser o vento forte
ou também a bruma
que acaricia as folhas da palmeira
ou pode ser a mão de deus e sua ira!

Misterioso como a serpente
Sábio transcedental feito um vidente
Atraente como um imã
Doce como a mais doce das laranjas-lima

O coração é tão envolvente
muda os ventos, mostra o rumo
inunda a mente...
O que será tão urgente?...
O instinto sabe que a dor
Por mais assustadora se dissipará
O I Ching já nos revelou
Que todo sofrimento o tempo vem curar

E sempre será assim
Qualquer prazer até pode trazer a dor
Mas lembre que nunca tem fim
Da própria dor também nasce o prazer maior!



JÓIA RARA 
Jota Maranhão

Paixão que serpenteia
Hôme que cai na rêde
Joga o corpo e mata a sêde
Amante da jóia rara
Fica lá nas profundesas
Do canto de iara...

Num delírio de rio
Que corre pras água funda
Salina, acre-doce do fio
Que tece a teia e tenteia, tenteia, tenteia...

Peixe que vira mulhé
Que rouba a alma da gente
E deixa a lua espiando
Vazando na maré cheia
Os ólho que fica mudo
Engasgado na areia

Ó... Deus trovão joga um raio
Crava no meu coração
Num vejo nem mais poesia
Na prata que me alumeia
Que roça nas pedra da encosta
Parando o tempo e o vento
Dentro das concha do mar

Às vêze a vida sorteia
Às vêze dá volta e meia
E quem arma sua rêde
Debaixo de côco duro
Ou é sortudo de vêz
Ou é maluco ou é burro
Ou talvez seja porque
Ouviu o canto da sereia
E num qué mais viver !...



ÊXTASE
 
Jota Maranhão

Quando você me ama
Tenho a sensação de estar voando
Numa nave que vai me levando
Por estrêlas mais brilhantes,
Mais distantes...

Quando você me chama
No meio da noite e me reclama
Vejo acender em nossa cama
Duas chamas de prazer e aventura

Chego a loucura
Êxtase no brilho desse amor
Que não tem razão pra mim
Se não for assim

Quando você me toca
Num delírio de suor e gôzo
Sinto a vibração na pele morna
Despertando fantasias e aventuras

Chego a loucura
Êxtase no brilho desse amor
Que não tem razão pra mim
Se não for assim



CARMESIM

Jota Maranhão

Tão cruel quanto matar uma flor
Deixando a terra secar
É aos poucos deixar a mulher
Sem carinho e amor

Assim como a flor vai perdendo a cor
E a fragrância vai deixando de ter
A mulher vai sofrendo a dor
De uma desilusão

Se o homem pudesse entender
O que faz quando planta uma flor
No lado esquerdo do peito de uma mulher
Ah!... Se o homem pudesse entender

Não regar uma flor, é negar um jardim
E o brilho de amor carmesim
Mas o homem se esquece
E assim essa flor vai nascendo e morrendo
Sem fim !...



ASAS CORTADAS 
Jota Maranhão / Jorge Vercillo

Eu, pássaro perdido
Que avoou sem mêdo quando era menino
Sério, chego a me lembrar
Mas logo chega o mundo pra intimidar

Êles gritam e conseguem me assustar
Eu me sinto gaivota sobre o mar
Que afundou as asas nas manchas de óleo
ao mergulhar
E agora não consegue mais voar

Sei, sei tudo que posso
Mas vem essa lei e impõe o ócio
Quem tem um olho é rei
Mas se eu desafiar, incomodarei

Vêz em quando bate um vento por aqui
Abro minhas asas pra tentar subir
Mas com tanto tempo preso à essas grades,
Me esqueci
E agora tenho mêdo de cair

Tiê !... Venha das alturas me salvar
No maciço da Tijuca pousará
Onde as nuvens se debruçam
E eu não canso de esperar
Sua liberdade me libertará !

Abra as suas asas
Vai sem mêdo, vai
Vai ganhar o céu
Quem provou da liberdade
Não terminará preso às próprias grades

Um dia eu vou voar
Eu já vivi no ar
Vem me vêr voar
Vem me vêr voar !...



FLAMBOYANT
Jota Maranhão / Paulo Cesar Feital

Por quantas noites eu me vi desencantar
Enquanto os palcos desabavam sobre mim
O meu amor então beijava o meu olhar
Dizia: vamos lá, levanta e vai cantar!

Eu me vestia e ela ia amamentar
Nosso menino era platéia e camarim
E dos seus seios parecia perguntar
Meu pai, o que é que há ?
Me beija e vai cantar !

E eu sabia que tinha de ir
Pra amenizar toda a dor da cidade
Então pousava nos pianos por aí
Tal qual um sabiá pousa num flamboyant

Por quantas vêzes eu pedi a deus de manhã
Deixar eu cantar pro Brasil
Abrir o portão, o leite e o pão
E o rabo do cão que diz não quando é sim

Meu amor já na porta de casa
Tendo ao colo o nosso arlequim
Me dava a impressão
De um samba de Tom Jobim !

Até que um dia eu resolvi desencantar
E desabei por sobre os palcos do país
O meu amor ainda beija meu olhar
E eu digo: vamos lá, cantar pra quem chorar!

Eu peço a deus para poder doar a luz
Que a minha voz cumpra a missão de atenuar
Toda a amargura dessa terra de jesus
E eu digo: vera cruz, canta pra não chorar !

E pros que cantam nos seus cabarés
Tenham orgulho dessa profissão
Pousem nos galhos dos pianos, violões
Que a voz é um colibri nas flores das canções

E todo dia eu peço a deus pela manhã
Conserve-me a simplicidade
Pra ter no portão o leite e o pão
E o rabo do cão que diz não quando é sim...

Meu amor sempre à porta de casa
E o sorriso do meu arlequim
E um céu de emoções
Que eu sou uma luz assim a brilhar,
A brilhar, a brilhar...

Meu amor sempre à porta de casa
E o sorriso do meu arlequim
Sou um samba canção eterno de TomJobim
A cantar, a cantar, a cantar !...

2 comentários:

Soninha disse...

Vc é extraordinário...

Cris Vianna Rj disse...

Filosofia de amor é uma das canções mais lindas que eu já ouvi, e você interpreta com a alma, um verdadeiro poeta.